“Desde quando eu como caracóis? Desde sempre!”: na concha do caracol, o sabor de Charentes

Em Saint-Georges-de-Didonne, perto de Royan, a noite da cagouillade reuniu cerca de cem apreciadores do petit-gris preparado no estilo Charentaise, segundo a receita tradicional. Relato da mesa dos cagouillards, sob os pinheiros-mansos.
Cada um com seus próprios chifres. Nas Landes, há os touros nas feiras e as vacas para serem empurradas para o lado entre duas taças de Jaqueline. Na Charente, há as noites de cagouillade com Pineau. Em patoá, isso significa um banquete de petits-gris. Uma reunião certamente menos conhecida que a éclade – uma preparação de mexilhões característica da culinária da Charente –, mas mais sofisticada. Um deleite para os iniciados, apreciado com a ponta dos dedos nas noites de verão sob os pinheiros-mansos. Como nesta quarta-feira em Saint-Georges-de-Didonne, perto de Royan, em Charente-Maritime, na Place des Cagouilles.
"Desde quando eu como caracóis? Desde sempre", ri Philippe Allaire, presidente da associação de moradores de Didonne-Boube, organizadora da noite. O objetivo da associação: tirar os moradores locais de suas conchas e sofás, para criar o que os políticos chamam de "viver juntos". Com um toque local. Éclade, mercado de pulgas, petanca, exposição de caracóis: uma retrospectiva do litoral em cartões-postais antigos.
Escaldado vivoUm ensopado de caracóis não se improvisa. Às 5h30, as panelas estão prontas. Jean-Louis Aubier, também conhecido como Vovô Custot, espera até o último minuto para tirar os animados caracóis cinzentos da geladeira. Eles foram entregues na noite anterior, direto da Ferme enchantée em Guitinières. O timing é tudo menos um detalhe: "É preciso escaldar os caracóis enquanto eles dormem", explica ele. "À medida que se aquecem, eles acordam. Mergulhá-los em água quente fixa sua forma."
É mais educado apresentar caracóis cuidadosamente dispostos em seu interior do que exibir o gastrópode em um prato com os chifres para fora... "É mais apetitoso", acrescenta Jean-Louis, filosofando sobre essa sensação de "quente-frio". "Claro, eu não gostaria de estar no lugar deles", sorri.
Purê de tomate, carne de linguiça, pineauA receita, a mesma e antiga, está afixada acima do fogão: refogue as cebolas, adicione um pouco de caldo de galinha, purê de tomate, um bouquet garni, uma pitada de alho, salsa, vinho branco, sal e pimenta. Cozinhe em fogo baixo por umas boas duas horas. O cheiro já está aguçando as narinas dos jogadores de petanca.

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"Porque os Charentais comem caracóis, é assim, nós somos caracóis, é a tradição dos mais velhos"
Mas o verdadeiro segredo dos caracóis à charentaise está no toque final: um toque de Pineau e carne de linguiça. "Depois, é preciso mexer delicadamente e por bastante tempo para que a carne penetre nas conchas", diz Jean-Louis. No último momento, só falta ferver as batatas para o acompanhamento. "E pronto, caracóis à charentaise", acrescenta. "Porque os charentais comem caracóis, é assim mesmo, somos gente de caracóis, é a tradição dos antigos."

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"Um prato tradicionalmente presente no cardápio de Natal", diz Mary, também conhecida como Vovó Cozinheira. Uma refeição festiva, portanto, bem merecida: "Antigamente, costumávamos colher os caracóis nós mesmos do jardim", diz Jean-Louis. "Nós os armazenávamos em uma caixa, para que morressem de fome até o Natal." Para outras ocasiões, o gastrópode pode ser temperado de forma diferente, com manteiga de salsa, por exemplo, e grelhado na lareira.

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O aroma atraiu uma multidão à Place des Cagouilles. Há vizinhos lá, tentados pelo cheiro. Como Céline, moradora de Bordeaux que passa todas as férias em Saint-Georges. Ou visitantes de verão. Como esta mãe e filha, que vieram da Borgonha, curiosas para descobrir a versão de Charente. Um bebê. Uma família inteira, que veio com o adolescente, "não pronto" para comer caracóis. Amigos. Jogadores de petanca. Clientes regulares. Alguns conhecem, outros nunca experimentaram.
Como você come? Como Philippe, o presidente, faz. Ele pega uma concha da panela, queima os dedos, vasculha o interior com um espeto de madeira, tira o molusco e o coloca na boca. "É uma delícia!!!" ele ri, antes de sorver o molho. Sem complicações.

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“Ano após ano, a cagouillade está se tornando cada vez mais popular.”
Céline lambe os dedos. "Está excelente, feito à moda antiga", diz ela, comprando uma bandeja para viagem "para [sua] filha e [seu] genro". Nesse momento, os Cagouillards, o grupo de dança folclórica convidado para animar a noite, explodem de vida ao som de "La Pêche aux moules". O sol se pôs atrás dos pinheiros-mansos e a noite está chegando ao fim. Um verdadeiro sucesso. "Ano após ano, a cagouillade está cada vez mais popular", conclui a presidente. Contando as inscrições, Lulu, "a secretária das bocha", concorda com a cabeça.
Ao saírem, a multidão parabeniza os cozinheiros. "Faz quarenta anos que não como um Charentaise", confessa um arrependido. É isso que é cagouillade: Charente no prato, o sabor do país. Com vontade de voltar.
SudOuest